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EU, ELDER F.


Livros, filmes, fotografias e histórias contadas pela metade.

Da volta pelos EUA, da mistura e da cafonice

Na terça-feira passada, dia 19 de agosto, completei um ano nos Estados Unidos e talvez aqueles que me conhecem de mais longa data (e sabem da minha predileção por dramas) tenham se perguntando por onde andava meu post gigantesco falando sobre a experiência do intercâmbio e as descobertas que fiz nesse caminho tão longo. Mas posso me retratar, não é que eu tenha perdido o lado dramático (o que na verdade só aumenta com o passar dos anos), mas é que decidi fazer o tal post mega clichê porém imprescindível apenas no final do intercâmbio. O que me motiva a escrever dessa vez, portanto, é que já tem um tempo que não exercito a escrita por causa do tempo tão escasso. Antes de começar, porém, acho prudente atualizar os leitores das minhas andanças na terra do fast food e da batata frita (para o desespero das magérrimas).

No final do ano de 2013 saí da Community College onde fiz o primeiro semestre de inglês em Batavia, New York e entrei na State University of New York em Geneseo, New York, onde conheci muita gente diferente que a cada dia mais abriam meus olhos para a diversidade desse mundão sebastião. No meio de maio consegui um estágio de verão em uma empresa chamada LexisNexis e me mudei para Atlanta, Georgia.  Lá tive a experiência mais frutífera do intercâmbio e conheci outras tantas pessoas incríveis. Logo depois de ter acabado o estágio, me transferi pra University of Montana em Missoula, Montana, pois a universidade lá de Nova York não tinha mais cursos avançados de computação. Um pouco antes, porém, passei 18 dias na Califórnia, o que, além de me proporcionar uma pele mais escurinha e queimada, resultou numa conta no negativo (obrigado de nada). Mas no final de tanta andança, acumulei mais obervações sobre os Estados Unidos e aumentei os machucados no coração (imaginem quantas despedidas aconteceram em todo esse tempo, pois é, meu coração tá abatido coitado).

Então vocês se perguntam o motivo de eu ter explicado toda minha vida nômade nos EUA, mas a razão de um parágrafo inteiro ter sido dedicado as minhas andanças é pra que fique bem clara a quantidade de lugares por onde andei e o número de pessoas que cruzei durante essa jornada (que ainda não acabou para o desespero das inimigas). Na Califórnia, encontrei um amontoado de mexicanos e acreditem, quase cheguei em Tijuana no México quando estava em San Diego (quase pulo lá só pra fazer check-in). Em Atlanta, encontrei uma população afrodescendente gigante como nunca antes eu tinha visto nos EUA. Era realmente muito bom poder entrar nas lojas e os olhos dos seguranças não te seguirem por você ser mais escurinho assim que nem eu (como acontece no Brasil, por exemplo), pois a maioria da população é negra por lá, o que evita esse julgamento por cor. No estado de Nova York, uma maioria branca, rica e hétero (mentira), mas uma população sem dúvida majoritariamente mais clarinha que a do sul dos EUA (e um tantinho mais preconceituosa também pelo que percebi - diferente do antigo cenário norte/sul nos Estados Unidos).

Nesse caldeirão que é os Estados Unidos, percebi recentemente ao observar tanta mistura, que o que mais sentirei falta daqui quando voltar para a minha terrinha é a liberdade que você tem para usar o que lhe faz sentir bem sem ter dedos apontando para você. Eu passei por lugares com tanta gente diferente e ainda assim a mentalidade se mantinha a mesma. É possível encontrar vários estilos nas ruas desse país e no início tudo pode parecer "ridículo" pra gente que vem de uma cultura diferente, mas depois que a gente se acostuma e começa a ver tudo com mais naturalidade, nós mesmos tomamos liberdade para usar o que sempre tivemos vontade, mas também sempre tivemos receio de usar por causa das represálias. Homem com short acima do joelho no Brasil é chamado de gay. Nos EUA, é apenas homem com short acima do joelho. Mulher com cabelo azul (porque é a cor mais quente) no Brasil é rebelde, hipster, shimba, quer chamar atenção, etc. Nos EUA, mulher com cabelo azul é só uma mulher com cabelo azul.

Embora ainda existam regiões conservadoras nos Estados Unidos, a liberdade para se expressar através da sua indumentária é comumente aceita no geral (mas não que isso dependa da aceitação alheia, é bom deixar claro). Nunca antes senti tanta liberdade em vestir o que eu quero sem ter que me preocupar com o julgamento alheio ou me sentir acuado pelos outros (eu sei que tem todo a filosofia de você é você e dane-se os outros, mas ser o outsider às vezes incomoda). Na universidade é comum, por exemplo, ver americanos usando chinelos no estilo rider que você só enfia o pé e junto com isso meias brancas que sobem até o joelho. No início parece estranho para algumas pessoas, mas depois você passa a entender que se o indivíduo está se sentindo bem e confortável, a roupa/estilo dele/dela realmente não tem muito a ver com a sua opinião. No Brasil, por outro lado, consigo prever os posts gigantes que existiriam no Facebook dos ditadores de regras dizendo o quanto essa moda é cafona e old week (caso pegasse por lá).

Na minha cidade mesmo, Belém (lá no norte bem norte obrigado), há um tempo atrás estava surgindo a moda da coroa de flores e na época cheguei a ler muitos posts dos ditadores do "como você deve se comportar" falando o quanto tudo isso era cafona, brega, volta pro mar oferenda, etc. E assim, de repente, você não tem mais liberdade de usar o que quer e da forma que quer porque você vai sofrer represália dos tais ditadores do comportamento. No final, a gente acaba se moldando ao padrão desses senhores sem perceber. Por algum motivo, para essa galera ditadora, a última (e única) moda da estação é julgar incessantemente. Mais ainda, há um ano atrás, na mesma Belém, uma aluna foi impedida de entrar no colégio por ter o cabelo azul e em uma conversa com a mãe da aluna o diretor da escola afirmou que esse "comportamento incomum" é aceitável em lugares como São Paulo, mas não no "final do planeta" que é o Pará (moro no final do planeta, beijos, estão todos convidados a aparecer lá).

Um amigo recentemente enviou uma foto dos EUA para alguns amigos brasileiros e um deles notou a forma como um dos americanos na foto se vestia e enviou um "nossa, todos os americanos são cafonas assim?". De novo, o julgamento dá um passo a frente enquanto o indivíduo continua sempre ali atrás, impedindo a si mesmo de se permitir. No final, parece que ninguém tá preocupado se o "cafona" está se sentindo bem com o que está vestindo ou se a roupa "brega" está conveniente. O que importa mesmo é fazer o papel do esquadrão da moda e ditar as regras do que se deve e não se deve vestir como se você fosse o(a) senhor/senhora da razão. Em todos os cantos dos EUA que andei, em nenhum encontrei esse tipo de intolerância e provavelmente esse é um dos aspectos desse país que mais sentirei falta quando voltar. E sobre o amigo do início do parágrafo, como resposta pro menino do Brasil, ele apenas enviou um: "bicha, a senhora ainda não tá preparada pro primeiro mundo mesmo, viu, viado?".



6 comentários:


  1. No momento invejando sua estadia nômade nos EUA, mas deve ser horrível mesmo se separar de todos que conheceu durante esse tempo :/
    Sobre os preconceitos com roupa também sou contra os ditadores de moda da internet e não me visto pra agradar ninguém, enquanto a roupa tiver confortável é o que importa.

    HAHAHAH GLITTER MELHOR REALITY.

    Abs

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  2. Elderito, meu querido Elderito, como um post sobre teu intercambio termina dando uma lição aos pobres homens tratantes do mundo? Ah, como te dedico!
    Bem, nosso final de mundo precisa evoluir bastante, sabemos, e creio que esse tipo de ~opiniões~ se deve não apenas a falta de respeito, mas a um costume terrível que precisamos mudar urgentemente.
    Gostamos de rir das pessoas? Gostamos. Mas precisamos aprender a respeitar espaços. E, convenhamos, as pessoas julgadas precisam se impôr também. Tipo, "QUEM TU PENSA QUE É NA FILA DO PÃO PRA FALAR DAS MINHAS ROUPAS, SEU IMUNDO?!" e panz e panz. Isso é realmente evolução: de mente, de conteúdo, de horizontes. Bom saber que a terra do tio Sam anda bem nesse aspecto.
    Bem, quando voltares para o fim do mundo, vam queimar colchões na Almirante Barroso para as mães desses maus educados darem palmadhênhas mais fortes.
    Beijos, tchau, saudades.

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  3. Um dos motivos que me fazem ter tanta vontade de viajar pelo mundo e ter essa visão de culturas diferentes.
    Eu te entendo em relação à intolerância alheia. Fiz uma californiana no cabelo (algo simples, se comparando a cabelo azul, convenhamos) e tooodos ficaram tipo "oh, como vc é louca!". E num primeiro momento, em que todos pareciam ter gostado, veio gente depois me dizer "Monique, por que você não tira esse loiro?", detalhe: a mesma pessoa que havia elogiado. A questão é que as pessoas em geral botam tanta pilha na gente, pra fazer ou não fazer alguma coisa, que até nossa própria opinião fica meio deturpada. Será que não arriscaríamos algo caso tivéssemos certeza daquilo ser aceito pela sociedade, justamente porque então não seria um risco?
    P.S.: cabelo azul é lindo ~~

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  4. Oi!
    Adorei seu texto. Claro que sentir uma invejinha foi inevitável... mas te garanto que foi branca! Hahahahahahahahaha.... (ô expressão preconceituosa).

    Desde criança que me sinto uma "outsider" aqui no Brasil. E olha que eu não costumo fazer nada errado (talvez esse seja o meu problema). Hoje, já passando dos 30 parei de ligar pro que o povo pensa ou acha, mas sim, é uma sensação ruim que eu acabei dando um jeito de achar graça.
    Quando fiz uma mecha pink no cabelo (por baixo, na nuca, pra não chamar lá muita atenção) recebi muito apoio. Muita gente gostou. Mas não deixei de ouvir um: "Você não tem mais idade pra isso. Sua adolescência já acabou". Aff... Na embalagem da tinta não tinha indicação de faixa etária. (Devia ter respondido isso para o enxerido do Facebook, mas no final só bloqueei ele mesmo.. hehe).

    Um dia ainda pretendo ter uma experiência como a sua! :) Acho que deve ser muito bom!

    Beijusss;
    http://hipercriativa.blogspot.com.br/
    https://www.facebook.com/BlogMenteHipercriativa

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  5. Elder seu texto me fez refletir bastante, inicialmente não sei bem o que dizer por não ter passado por esse tipo de experiência de despedidas muitas vezes, aliás, que me lembro apenas uma. Se já foi difícil para mim uma única vez imagino para você que além de amigos estava "deixando para trás" parte do que vivênciou nesses lugares. Quanto a ditadura da moda acho engraçado que muitos ao lerem isso irão dizer "no Brasil se julga demais" e ao virar as costa irá torcer o nariz para o estilo independente de outro. infelizmente somos pobres ao aceitar o desconhecido, é por isso que o preconceito com relação ao que o outro veste ou deixa de vestir é tão grande em nosso país. Não posso dizer que nunca julguei, mas foi justamente por essa cultura (mídia ou seja lá o que for) que nos abafa e nos faz acreditar que existe o certo e o errado em questão de moda. O que me lembra do padrão de beleza, mas não vou entrar neste tópico se não vou escrever um texto e não um cometário.
    OBS: J á disse que adoro seu blog, suas ideias e inspirações. Não consigo entrar aqui e sair sem ler algo. parabéns pelo excelente trabalho. Alias, me desculpe fazia tempo que não vinha aqui O.o

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  6. É...eu não sei se teria a coragem que teve em se aventurar por um país fora do que nasceu. Enfim...isso porque meu inglês é péssimo. Caso um dia isso aconteça acredito que o que guardarei com maior recordação será justamente as pessoas que conhecerei e os lugares que vou visitar...deve ser show. Sei que tudo tem prós e contras, mas, se pudesse e meu inglês desse eu até tentaria. kkkk E aqui no Brasil muito me irrita esses 'apontões' de dedo...em São Paulo (centro) até que o negócio é melhor, mesmo assim, não tem comparação.
    Beijos!
    Monólogo de Julieta

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